7 de novembro de 2015

SOBRE UM PEDAÇO DA INFÂNCIA

Como qualquer história, essa começa com um pouco de esperança e até vitimismo. Eu tive uma infância normal, fui uma criança qualquer brincando na praça ou no clube, essas que hoje em dia passam por você desapercebidas, cheias de medos e falta de autoconfiança, mas existem detalhes e situações que nos diferenciam e tornam quem somos. Meu pai sempre foi ausente não me lembro dele em nenhuma formatura, festa ou comemoração que me envolvesse, mas as lembranças dele me batendo são as mais fortes. Ele viajava bastante por causa do trabalho, o que possibilitou e ajudou suas "escapadas". Sempre fui gay, desde pequeno eu tinha um sentimento que era incapaz de compreender, passei por tudo sozinho a compreensão, a aceitação e a coragem de ver quem eu era. A aceitação foi a parte mais difícil eu perdia noites me batendo, noites em claro lutando com aquela vontade, porque eu fui ensinado a não ser assim e mesmo não me encaixando nos "padrões" eu queria ser hetero, eu queria dar orgulho a minha família e não a vergonha de ser o "viadinho" que eu era, sabia muito bem o que enfrentaria na rua e em casa, sabia das agressões verbais e físicas que sofreria e isso me apavorava, me assustava de uma maneira absurda, foi nessa época que começou a autoflagelação, pois eu sentia na dor a dormência dos meus problemas ridicularizados. Certa vez quando era bem novo (8-9 anos), eu estava em um clube com minha família e eu precisava ir ao banheiro trocar de roupa, e sempre tive esse receio com meu corpo aversão a esse pedaço de carne e gordura, e fui já com vergonha e medo de quem estaria lá, cheguei e vi que estava lotado aquilo, sem box para trocar de roupa, voltei correndo tentando explicar a situação, meu pai me pegou pelo braço me arrastou de volta ao banheiro, dizendo que eu parecia um viadinho e me fez trocar de roupa na frente de todo mundo, não adiantou implorar e muito menos chorar. Depois de um tempo parei de chorar, toda vez que ele me batia ele falava que não era pra chorar e só parava de bater quando eu ficava em total silêncio. Fui tocando a minha vida até que com 17 anos eu sai de casa pra estudar e ao mesmo tempo que foi libertador eu senti uma dor horrível encarando a vida de frente.

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